O post de hoje é uma representação integral de um dos capítulos da tese de Doutorado de Cesar Diniz, um dos sócios fundadores da empresa. A reprodução do material aqui exposto é portanto livre e encorajada, desde que respeitados os devidos mecanismos de citações acadêmicas. Interessou-se pelo texto, basta cita-lo e aqui uma forma de faze-lo:
C. Diniz, “Três Décadas de Mudanças na Planície Costeira Brasileira: O Status Dos Manguezais, da Aquicultura e Salicultura a Partir de Séries Temporais Landsat e Técnicas de Aprendizado de Máquina”, Tese de Doutorado, Universidade Federal do Pará – UFPA, 2021.
Neste post vamos tratar, de maneira um pouco mais detalhada, sobre os domínios da informação no Sensoriamento Remoto, de maneira a compreender melhor a investigação das características de um alvo e os motivos por trás da escolha de um classificador, da definição de classes a serem separadas e dos atributos a serem utilizados em uma eventual separação…Bom, chega dos por menores, vamos ao post!
OS DOMÍNIOS DA INFORMAÇÃO
O sensoriamento remoto adquiri informações sobre a superfície da Terra provenientes de três domínios essenciais (Jensen 2014, Novo 2010): o domínio do espectro (comprimento de onda ou frequência, propriedades reflexivas ou emissivas); o domínio do espaço (forma e tamanho do objeto, posição, local, distribuição, textura e vizinhança); e o domínio do tempo (mudanças do objeto/superfície ao longo do tempo), Figura 1.
Figura 1 – Os três principais domínios de informação do sensoriamento remoto. Os domínios do espectro, do tempo e do espaço.
Maior parte dos estudos inerentes ao sensoriamento remoto se baseiam no desenvolvimento de uma relação determinística entre a quantidade de energia eletromagnética refletida, emitida ou espalhada e as características químicas, biológicas e físicas dos fenômenos, superfícies ou objetos que se investigam (Jensen 2014, Novo 2010). Nesse sentido, é o domínio espectral que fornece a informação responsável pela separação entre os alvos “A” ou “B” na superfície terrestre. Onde, a resolução espectral é definida pelo número e dimensão (tamanho) dos intervalos de comprimento de onda (bandas) para o qual um sensor é sensível (Jensen 2014, Novo 2010).
Todavia, as características puramente espectrais, entre dois ou mais alvos, podem não ser suficientes para que estes sejam distinguidos entre si. Em casos como este, de evidente similaridade espectral, é necessário lançar mão de atributos de domínios outros, como tempo ou espaço, para que se consiga atingir a individualização entre alvos.
É o que acontece, por exemplo, na separação entre pastagem e certos tipos de cultivos agrícolas (Adami et al. 2012, Rudorff et al. 2010). Estes dois usos da terra, podem apresentar sinal espectral característico de uma diversidade de momentos fenológicos. Pastagem e cultivos de cana-de-açúcar, por exemplo, experimentam, ainda que sejam usos da terra distintos, fases fenológicas similares e, portanto, diferentes padrões espectrais ao longo do desenvolvimento vegetal. Entretanto, ambos os usos, podem apresentar simultaneidade temporal entre uma ou mais fazes de seu desenvolvimento (preparo do solo, semeadura, maturação vegetal e colheita).
Dessa maneira, sem o suporte das séries temporais, sempre existiria para estes dois usos a probabilidade de estarmos observando, em um momento instantâneo t, a mesma fase de desenvolvimento fenológico, sejam estes pastagens ou agricultura. O domínio do tempo, é então, absolutamente relevante para a separação de padrões agrícolas e pastoris (Figura 2).
Figura 2 – Representação da Plataforma SatVeg (EMBRAPA-CNPTIA). Variação temporal de séries NDVI-MODIS sobre pastagem cultivada e agricultura anual de dois ciclos.
Por vezes, porém, nem propriedades temporais e tão pouco as espectrais, são suficientes para discriminar alvos “super semelhantes”, que acabam por se comportar de maneira similar em ambos os domínios, o do espectro e do tempo. Esse é o caso da separação dos padrões aquícolas e salineiros de alvos outros, que contenham água em superfície como característica predominante ao longo do tempo (Figura 3A e 3B).
No litoral brasileiro, a aquicultura e a salicultura compõem atividade econômica tradicional (Costa et al. 2013, IBGE 2019b, Lima 2017, Queiroz et al. 2013, Tenório et al. 2015). Assim, no que diz respeito a persistência temporal da atividade aquícola-salineira é natural que exista um conjunto diversificado de consolidação desta atividade, com infraestruturas mais antigas, mais recentes e padrões de abandono da atividade (Costa et al. 2013, Diniz et al. 2021; Diniz et al. 2017, Lima 2017). Em decorrência disso, o domínio temporal pode renunciar à capacidade de distinguir entre padrões aquícolas/salineiros bem consolidados, de canais principais de rios, lagos e lagoas perenes e águas abertas (Figura 6B), uma vez que todas essas feições podem apresentar elevada persistência temporal ao longo dos anos (Pekel et al. 2016, Souza et al. 2019).
De maneira similar, no domínio do espectro, a menos que se apresente uma alta concentração de compostos opticamente ativos, por exemplo, sedimentos em suspensão, algas, matéria orgânica e outros (Marinho et al. 2021, Marinho et al. 2020, Mertes et al. 1993), pouco pode ser feito para discriminar espectralmente uma variedade de corpos d’água (Barbosa et al. 2019, Gao 1996, Xu 2006). Em casos como este, onde a cobertura natural entre os alvos a serem separados é a mesma e a persistência temporal é também similar, o domínio do espaço/contexto, ao invés do espectral ou temporal, pode ser a chave para distinguir entre rios, lagos e lagoas perenes e águas costeiras.
Figura 3 – Características espectrais e temporais de corpos d’agua. Em A, variação do MNDWI, em três alvos distintos. Em B, percentual de ocorrência de água superficial ao longo de 34 anos. Ainda em B, a tonalidade azul escuro representa ~100% de ocorrência, azul claro/ciano menos de 10%. Os marcadores em verde apontam para amostras oceânicas, vermelhos para estuários e azuis para aquicultura/salicultura.
A análise da vizinhança, é essencial para acessar o domínio do espaço/contexto. Nesse cenário, os classificadores contextuais têm a vantagem de prever o rótulo de cada pixel, partindo de regiões de treinamento ao entorno de cada posição da matriz. A estratégia de agrupamento da vizinhança, de diferentes maneiras, fundamenta o funcionamento dos classificadores contextuais, sejam eles orientados a objeto – OBIA (Baatz & Schape., 2000); baseado em redes neurais convulsionarias – CNN (Jin et al., 2019) ou no uso combinado dos dois – OCNN (Zhang et al., 2018), fornecendo a todos estes a capacidade de acessar o “domínio do contexto” ao invés de se ater a valores de pixel isolados.
Por estas razões, a compreensão do comportamento de seu alvo de interesse, em todos os três domínios da informação do Sensoriamento Remoto, o espectro, o tempo e o espaço é, necessariamente, tarefa anterior a escolha de seu classificador, a definição das classes e dos atributos a serem utilizados em eventual separação. Não havendo, sob hipótese alguma, qualquer grau de coerência na decisão sobre classes, classificadores ou atributos, sem que se conheça os domínios da informação que caracterizam seu alvo.
Abster-se da compreensão espaço-espectro-temporal de seu alvo, significa atribuir ao acaso o sucesso de suas escolhas. Em uma década marcada pela criação, em profusão, de novos algoritmos de classificação, novos sensores orbitais e usos da terra cada vez mais diversificados, valer-se da sorte/acaso não parece ser a escolha mais inteligente, muito menos a mais eficiente. Ciência e sorte, são como água e óleo, se você for dos menos afortunados de sorte, condenará dezenas, centenas ou até milhares de horas de trabalho direto a lata do lixo.
Por hora é só. Bons estudos e até a próxima!
REFERÊNCIAS
Adami, Marcos et al. 2012. “Remote Sensing Time Series to Evaluate Direct Land Use Change of Recent Expanded Sugarcane Crop in Brazil.” Sustainability 4(4): 574–85. http://www.mdpi.com/2071-1050/4/4/574.
Barbosa, Claudio Clemente Faria, Evlyn Marcia Leão de Moraes Novo, and Vitor Souza Martins. 2019. Introdução Ao Sensoriamento Remoto de Sistemas Aquáticos: Princípios e Aplicações. Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais.
Costa, Diógenes Félix da Silva et al. 2013. “Breve Revisão Sobre a Evolução Histórica Da Atividade Salineira No Estado Do Rio Grande Do Norte (Brasil).” Sociedade & Natureza 25: 21–34.
Diniz, Cesar et al. 2021. “A Large-Scale Deep-Learning Approach for Multi-Temporal Aqua and Salt-Culture Mapping.” Remote Sensing 13(8).
Diniz, Marco Túlio Mendonça, Fabio Perdigão Vasconcelos. 2017. “Natural Conditions for the Sea Salt Production in Brazil.” Mercator 16(5): 1–19. http://www.mercator.ufc.br/ojs3/mercator/article/view/1384 (January 6, 2021).
Gao, Bo-cai. 1996. “NDWI—A Normalized Difference Water Index for Remote Sensing of Vegetation Liquid Water from Space.” Remote Sensing of Environment 58(3): 257–66. http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0034425796000673.
IBGE. 2019. “Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA) – Produção Da Aquicultura Brasileira.” Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Jensen, J R. 2014. Pearson Education Limited,Harlow, England Remote Sensing of the Environment: An Earth Resource Perspective Second Edition.
Lima, Kellen Carla. 2017. “Impactos Econômicos Das Mudanças Climáticas Sobre a Indústria de Sal Marinho na Principal Região Produtora do Brasil.” Revista Brasileira de Geografia Física; v. 10, n. 2 (2017): Revista Brasileira de Geografia Física. https://periodicos.ufpe.br/revistas/rbgfe/article/view/234072/27478.
Marinho, Rogério R, Naziano P Filizola Junior, and Édipo H Cremon. 2020. “Analysis of Suspended Sediment in the Anavilhanas Archipelago, Rio Negro, Amazon Basin.” Water 12(4).
Marinho, Rogério R, Tristan Harmel, Jean-Michel Martinez, and Naziano P Filizola Junior. 2021. “Spatiotemporal Dynamics of Suspended Sediments in the Negro River, Amazon Basin, from In Situ and Sentinel-2 Remote Sensing Data.” ISPRS International Journal of Geo-Information 10(2).
Mertes, Leal A K, Milton O Smith, and John B Adams. 1993. “Estimating Suspended Sediment Concentrations in Surface Waters of the Amazon River Wetlands from Landsat Images.” Remote Sensing of Environment 43(3): 281–301.
Novo, Evlyn Marcia Leão de Moraes. 2010. Sensoriamento remoto: principios e aplicações. São Paulo (SP): Blucher.
Pekel, Jean-François, Andrew Cottam, Noel Gorelick, and Alan S Belward. 2016. “High-Resolution Mapping of Global Surface Water and Its Long-Term Changes.” Nature 540(7633): 418–22. http://dx.doi.org/10.1038/nature20584.
Queiroz, L, Sergio Rossi, J Meireles, and C Coelho. 2013. Ocean & Coastal Management. Shrimp Aquaculture in the Federal State of Ceará, 1970–2012: Trends after Mangrove Forest Privatization in Brazil.
Rudorff, B F T et al. 2010. “Studies on the Rapid Expansion of Sugarcane for Ethanol Production in São Paulo State (Brazil) Using Landsat Data.” Remote Sensing 2: 1057–76.
Souza, Carlos M et al. 2019. “Long-Term Annual Surface Water Change in the Brazilian Amazon Biome: Potential Links with Deforestation, Infrastructure Development and Climate Change.” Water 11(3).
Tenório, Geilson S, Pedro Walfir M Souza-Filho, Edson M L S Ramos, and Paulo José O Alves. 2015. “Mangrove Shrimp Farm Mapping and Productivity on the Brazilian Amazon Coast: Environmental and Economic Reasons for Coastal Conservation.” Ocean & Coastal Management 104: 65–77. http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0964569114003901.
Xu, Hanqiu. 2006. “Modification of Normalised Difference Water Index (NDWI) to Enhance Open Water Features in Remotely Sensed Imagery.” International Journal of Remote Sensing 27(14): 3025–33. http://dx.doi.org/10.1080/01431160600589179.
Zhang, Ce et al. 2018. “An Object-Based Convolutional Neural Network (OCNN) for Urban Land Use Classification.” Remote Sensing of Environment 216: 57–70. https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0034425718303122.
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